quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Para as próprias cabeças

Por João Paulo da Silva

Nos dias que antecederam o 5 de outubro, vi muitos artigos nos jornais exaltando as eleições como a “festa da democracia, a festa do povo”. De fato, é uma festa. Mas não do povo. Numa sociedade dividida entre espoliados e espoliadores, a democracia é na verdade uma ditadura do grande capital. A única diferença é que passou por uma cirurgia plástica. Provavelmente com o Ivo Pitanguy.

A festa é mesmo das grandes empresas, que controlam a economia, o Estado e os meios de comunicação. Assim, com campanhas endinheiradas, falsas promessas e mais tempo de TV, os candidatos dos exploradores do povo se esbaldam nessa democracia de meia dúzia de grandes empresários que segue o mesmo funcionamento de um jogo com roleta viciada. Na tentativa desesperada de esconder a existência das classes, a Justiça Eleitoral também fez a sua parte. Chamou a lindíssima atriz Lavínia Vlasak para dizer que “nas eleições não existem patrões e empregados”. Uma piada de muito mau gosto.

A verdade é que a burguesia paga a festa, a banda e ainda escolhe a música. De dois em dois anos, o povo é chamado apenas para legitimar um processo que favorece os patrocinadores. Business, baby. Business. Há algum tempo, o escritor uruguaio Eduardo Galeano fez uma provocante ponderação: “A liberdade de eleição permite que você escolha o molho com o qual será devorado.”. E depois dessa crise dos alimentos, desconfio que tenham cortado até o bechamel.

Cícero Almeida foi reeleito porque navegou em sua tsunami de demagogia, mentiras escandalosas e obras de fachada. E por mais que afirme ser o prefeito do povo, Cícero não pode esconder a felicidade da vitória nas urnas estampada no rosto de seu principal aliado de classe. O próprio usineiro João Lyra, depois de votar, chegou a dizer que “não houve disputa eleitoral. O que houve foi a força da candidatura de Cícero Almeida”. O resultado da eleição para prefeito de Maceió estava escrito no viaduto do bairro de Mangabeiras. A força da candidatura de Almeida tem a marca suja do dinheiro de gente como João Lyra.

Judson Cabral e Solange Jurema, que chegaram a se abraçar como velhos compadres depois da votação, não eram diferentes. Seus partidos estão maculados pela alegoria do “Robin Hood neoliberal”. O PSDB possui uma vasta experiência em tirar dos pobres para dar aos ricos. E o PT, bom aluno que é, aprendeu rapidinho a lição. Recentemente, o cronista Luis Fernando Veríssimo afirmou – referindo-se à política econômica de Lula – que “o PT é o PSDB de barba”. Na capital alagoana, a metáfora é com o cavanhaque do Judson.

Na manhã de segunda-feira, após a divulgação do saldo do estelionato eleitoral, os jornais estampavam a lista dos “escolhidos”. As manchetes traziam: “Câmara Municipal tem renovação de 60%”. Resta saber onde houve renovação. Ora, são os mesmos partidos que estão lá. Trocaram seis bandidos por meia dúzia de ladrões. É claro que meus números são imprecisos. Os verdadeiros são bem maiores.

Cícero ganhou a corrida eleitoral. Mas com Judson ou Solange o resultado seria o mesmo. Haveria apenas um vencedor: o lucro dos empresários. Nestas eleições, enganados pelos representantes dos donos da economia, os trabalhadores e o povo pobre acabaram colocando munição nas armas que estão apontadas para suas próprias cabeças. Os demônios do capitalismo, diante da crise econômica que sacode o planeta, vão exigir oferendas para que possam salvar a si mesmos. E os vencedores das eleições já escolheram aqueles que serão jogados às feras.

A História é uma rígida e severa professora. Ela já nos ensinou que as verdadeiras e profundas mudanças não são conseguidas com o voto. São retiradas à força. Primeiro se arranca os anéis. Depois, os dedos e a mão inteira. É claro que não haverá um mundo melhor se os espoliados não passarem por cima das eleições como um trator, assumindo os rumos das próprias vidas e fustigando a carroça da história. Porém, enquanto os trabalhadores ainda forem às ruas apenas para votar, abandoná-los a própria sorte será sempre um crime.

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Pequena Parábola Sobre a Democracia dos Ricos

A democracia dos ricos diz ao povo:
- Você pode votar, escolher os representantes.
- Mas eu quero votar e decidir os rumos da minha vida. – argumenta o povo.
- Bem, votar pode. Agora decidir os rumos da própria vida já é outra história, entende?

2 comentários:

Anderson Santos disse...

Faltou falar sorbe a candidatura e fachada do PSOL para prefeito, o que demonstra a fazenda psolista, ao menos em AL, cujos donos se chamam Mário Agra e Heloísa Helena.

Anônimo disse...

João Paulo, realmente você defende o peixe dos ideais socialistas com maestria; é embasado, tem repertório para o “dizer” além do “falar”. Pena que tais ideais tenham sido tão mal defendidos – e até mal expostos – pelo representante da classe trabalhadora durante o pleito municipal aqui em Maceió. A classe já está enfraquecida por uma ideologia capitalista dominante que enche a barriga dos que comem demais, e coloca alguma comida no prato daquele que nunca comeu – com medidas paliativas feito o “bolsa esmola”, a compra de votos etc. O resultado dos debates foi uma ridicularizarão de quase todos os candidatos, pelo despreparo e até pelo sentimento de inocência que alguns demonstraram em relação à política, mas nunca se falou tanto em Manoel de Assis quanto depois deles. Nem por isso o candidato deixou de ser um “cachorro morto”, desses que a gente passa diante e tem até o impulso de fazer um “em nome do Pai”, porém não o de chutar.