Dona Ritinha mora em Natal, capital do Rio Grande do Norte. Vive sozinha em sua casa e deve estar hoje na casa dos oitenta anos. Eu não a conheço pessoalmente, e o pouco que sei me chegou aos ouvidos através de um amigo. Fisicamente, só posso imaginá-la. Provavelmente tem longos cabelos grisalhos, o rosto cortado de rugas e um andar encurvado. Não sei ao certo. Sei apenas que sua única companhia é a presença incômoda da solidão. Acho que dona Ritinha é uma mulher infeliz.
Teve três filhos. Dois meninos e uma menina. De seu marido, não sei nada. Não sei se está vivo, morto ou entrevado. Já dos filhos, sei que os criou com todo o afeto que as mães possuem, mesmo as piores e mais desatentas. O amigo que me falou de dona Ritinha me disse que ela é uma pessoa muito amável e faladeira. Adora contar histórias. Registra tudo que pode em sua memória idosa. É a resistência da tradição das narrativas orais, muito comuns entre os velhos de tempos mais velhos ainda.
Outro dia, o tal amigo me fez conhecer uma história sobre a própria dona Ritinha. Depois de criados, os filhos desta velha senhora se foram. Tomaram seus rumos. Cada qual seguiu seu caminho. Um a um, foram deixando a casa onde cresceram sob os cuidados da mãe. E dona Ritinha os viu partir como se fossem pedaços que se desprendem do corpo com o tempo. Quando deu por si, estava só, cheia de ausência numa casa que parecia dobrar de tamanho com o passar dos anos. É verdade que os filhos mandavam notícias, apareciam de vez quando. Mas não era a mesma coisa.
Um dia, dona Ritinha resolveu pôr a casa para vender, com plaquinha de “vende-se” e tudo na porta. Começaram a aparecer interessados. Gente querendo olhar a casa, saber das condições e do preço. Dona Ritinha mostrava tudo. Falava dos cômodos, das instalações, do encanamento e da excelente fiação elétrica da casa. A velha senhora havia cuidado de seu lar como cuidara dos filhos e passava horas conversando com os possíveis compradores sobre as maravilhas do lugar. Entretanto, o negócio sempre esbarrava no preço.
Dona Ritinha cobrava uma fortuna pela casa. Os anos passavam e ninguém comprava o imóvel, embora quase toda semana aparecessem compradores interessados. Mas o alto valor sempre impediu a venda. Até hoje a plaquinha de “vende-se” continua na fachada da casa. Dia desses, porém, o tal amigo que me contou a história quis saber quanto dona Ritinha pedia pela casa. Ficou abismado.
- Mas também com um preço desses a senhora não vai conseguir vender nunca.
- E quem disse que eu quero vender esta casa, meu filho?
- Então por que diabos a senhora pôs essa placa de “vende-se”?
- Porque, graças a ela, de vez em quando aparecem pessoas para conversar comigo e me fazer companhia, mesmo que por algumas horas.
Sei que não há leis para isso, mas acho que deveria ser proibido ficar sozinho nessa vida.
Teve três filhos. Dois meninos e uma menina. De seu marido, não sei nada. Não sei se está vivo, morto ou entrevado. Já dos filhos, sei que os criou com todo o afeto que as mães possuem, mesmo as piores e mais desatentas. O amigo que me falou de dona Ritinha me disse que ela é uma pessoa muito amável e faladeira. Adora contar histórias. Registra tudo que pode em sua memória idosa. É a resistência da tradição das narrativas orais, muito comuns entre os velhos de tempos mais velhos ainda.
Outro dia, o tal amigo me fez conhecer uma história sobre a própria dona Ritinha. Depois de criados, os filhos desta velha senhora se foram. Tomaram seus rumos. Cada qual seguiu seu caminho. Um a um, foram deixando a casa onde cresceram sob os cuidados da mãe. E dona Ritinha os viu partir como se fossem pedaços que se desprendem do corpo com o tempo. Quando deu por si, estava só, cheia de ausência numa casa que parecia dobrar de tamanho com o passar dos anos. É verdade que os filhos mandavam notícias, apareciam de vez quando. Mas não era a mesma coisa.
Um dia, dona Ritinha resolveu pôr a casa para vender, com plaquinha de “vende-se” e tudo na porta. Começaram a aparecer interessados. Gente querendo olhar a casa, saber das condições e do preço. Dona Ritinha mostrava tudo. Falava dos cômodos, das instalações, do encanamento e da excelente fiação elétrica da casa. A velha senhora havia cuidado de seu lar como cuidara dos filhos e passava horas conversando com os possíveis compradores sobre as maravilhas do lugar. Entretanto, o negócio sempre esbarrava no preço.
Dona Ritinha cobrava uma fortuna pela casa. Os anos passavam e ninguém comprava o imóvel, embora quase toda semana aparecessem compradores interessados. Mas o alto valor sempre impediu a venda. Até hoje a plaquinha de “vende-se” continua na fachada da casa. Dia desses, porém, o tal amigo que me contou a história quis saber quanto dona Ritinha pedia pela casa. Ficou abismado.
- Mas também com um preço desses a senhora não vai conseguir vender nunca.
- E quem disse que eu quero vender esta casa, meu filho?
- Então por que diabos a senhora pôs essa placa de “vende-se”?
- Porque, graças a ela, de vez em quando aparecem pessoas para conversar comigo e me fazer companhia, mesmo que por algumas horas.
Sei que não há leis para isso, mas acho que deveria ser proibido ficar sozinho nessa vida.
9 comentários:
Oi João... adorei a crônica dessa semana. Parabéns. =*
Excelente!!!!!!! Pensar que no caminho das tecnologias modernas, as pessoas temerão ficar sozinhas apenas virtualmente, sem ningu´pem no messenger para conversar.
O mal do século é a solidão.
Lindo, João. E é uma verdade tristíssima o que acontece com alguns pais e mães em idades já avançadas.
Meu caro amigo João, que bela crônica!! Um texto tão lindo que tocou meu coração.
Saudade de você! Bjo
muito lindo mesmo. mas, num sei, fiquei com a impressão de já conhecer essa história. Será que tive um déjà vu?!
o que importa é que me tocou mesmo.
bju, parabéns.
muito boa cara!!! Fez-me lembrar do tempo em que morei na bernardo vieira nº 175 lagoa seca e de tudo que deixei por lá. Muito obrigado!!!!
Adorei o novo layout! saudade de tu =P
Certamente uma das melhores que eu já li em toda a minha vida. E estou sendo sincero.
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