Alfredo lia o jornal quando o filho de seis anos se aproximou com uma caneta na mão e disse:
- Pai, preciso de outra caneta. Esta não funciona mais.
- Amanhã eu compro, filho. – respondeu sem tirar os olhos do jornal.
- Mas tem que ser igual a do Maurício.
- Por quê?
- Porque ela é grande, bonita e tem cinco cores.
- Cinco cores?! – assustou-se.
- Isso mesmo, pai. Cinco cores.
- Pai, preciso de outra caneta. Esta não funciona mais.
- Amanhã eu compro, filho. – respondeu sem tirar os olhos do jornal.
- Mas tem que ser igual a do Maurício.
- Por quê?
- Porque ela é grande, bonita e tem cinco cores.
- Cinco cores?! – assustou-se.
- Isso mesmo, pai. Cinco cores.
Alfredo fechou o jornal, coçou a barba, olhou tristemente para o menino e falou:
- Desculpe, filho. Deve ser muito cara. Eu não posso comprar.
- Por quê?
- Porque nós somos pobres.
- Mas só nós?
- Não, filho. Um montão de gente também é.
- E é ruim ser pobre?
- É, filho.
- Por que é que o pai do Maurício pode comprar a caneta?
- Ele deve ser rico.
- Existe muita gente rica?
- Acho que sim, filho.
- Mais do que pobres?
- Com certeza que não.
- E é bom ser rico?
- É, filho.
- Desculpe, filho. Deve ser muito cara. Eu não posso comprar.
- Por quê?
- Porque nós somos pobres.
- Mas só nós?
- Não, filho. Um montão de gente também é.
- E é ruim ser pobre?
- É, filho.
- Por que é que o pai do Maurício pode comprar a caneta?
- Ele deve ser rico.
- Existe muita gente rica?
- Acho que sim, filho.
- Mais do que pobres?
- Com certeza que não.
- E é bom ser rico?
- É, filho.
O garoto calou-se por um instante, parecia estar submerso nos próprios pensamentos. Olhou intrigado para o pai e perguntou:
- Por que é que as coisas são assim?
- Assim, como?
- Uns podem ter. Outros, não. Uns são ricos e outros são pobres. Por quê?
Alfredo pensou, coçou novamente a barba e respondeu:
- São as regras, meu filho.
- Regras? – estranhou o garoto.
- Sim. O mundo tem suas regras. São elas que dizem o que a gente pode ou não fazer.
- Também são elas que dizem quem é pobre e quem é rico? – quis saber o menino.
Alfredo balançou a cabeça numa afirmativa.
- Não gosto das regras, pai.
- Eu também não, filho. Eu também não.
Fez-se um curto silêncio e, então, o menino disse:
- Sabe o que é que eu acho, pai?
- O quê?
- Que o bom mesmo seria que todo mundo pudesse ter canetas de cinco cores.
- Por que é que as coisas são assim?
- Assim, como?
- Uns podem ter. Outros, não. Uns são ricos e outros são pobres. Por quê?
Alfredo pensou, coçou novamente a barba e respondeu:
- São as regras, meu filho.
- Regras? – estranhou o garoto.
- Sim. O mundo tem suas regras. São elas que dizem o que a gente pode ou não fazer.
- Também são elas que dizem quem é pobre e quem é rico? – quis saber o menino.
Alfredo balançou a cabeça numa afirmativa.
- Não gosto das regras, pai.
- Eu também não, filho. Eu também não.
Fez-se um curto silêncio e, então, o menino disse:
- Sabe o que é que eu acho, pai?
- O quê?
- Que o bom mesmo seria que todo mundo pudesse ter canetas de cinco cores.
6 comentários:
Como vai, João? Estranho essa pobreza da caneta de 5 cores. Uma custa em torno de 6 reais. Mas já houve tempo, João, em que ter tinta e caneta era realmente coisa de rico, de ricaço. Era preciso ser muito rico para comprar papel e caneta.
Hoje, uma resma com 500 folhas custa quanto? Creio que na faixa dos R$ 15,00, mais ou menos. E uma caneta de cinco cores não é bem um artigo de luxo,não é? Até o mendigo do sinal pode comprar uma João.
Por que será que papel e caneta, coisas antes restritas aos ricaços, podem ser adquiridas por gente pobre? Há canetas bem mais baratas, não? Por um real ou dois, compra-se uma boa caneta. Aliás, essa história de caneta me lembrou um email interessante - destes que circulam por aí - onde são mostradas duas fotos. Uma é de uma reunião do gabinete de Barack Obama. O autor do email chama a atenção para as canetas vagabundas usadas por Obama e seus ministros/secretários. A outra foto mostra um tapete vermelho sendo estendido em algum ermo da Caatinga. O tapete era para receber São Lula de Garanhuns e comitiva. O desprendimento da reunião de Obama com ministros era contrastado com a pompa e alegorias transportadas para o meio da Caatinga para receber o presidente operário.
Engraçado que na crônica o pai do garoto lia um jornal. Bem, talvez o jornal seja mais caro do que a caneta pedida pelo garoto.
Entendo a alegoria que tentaste criar. Mas, considero que você não foi feliz no exemplo, pois se formos analisar a realidade dos fatos, nunca antes na história deste mundo tantos puderam ter acesso a canetas, lápis, papel, jornal, tapete, geladeira, tv, dvd, motos, carros, etc. As coisas melhoraram, João. Entendo as razões do teu pessimismo (são de natureza ideológica, se te recordas, já tivemos a oportunidade de discutir isso de forma rápida).
Diga-me João, qual a porcentagem da camada considerada pobre que tem um telefone celular? Quantos têm tv? Em cada esquina tem um vendedor de dvd pirata, principalmente em bairros pobres. A quem eles vendem?
O pessoal compra dvd para pendurar na parede?
Tu não sabes que aumentou significativamente o percentual de brasileiros que adquiriram eletrodomésticos? (na verdade, o Bolsa-família seria melhor definido como "bolsa-eletrodoméstico", pois a grana vai mesmo para as prestações desses produtos, não para comida).
Já te disse, não sei se vc se lembra. Conheço gente que comia lagartixa quando menino para não passar fome. Gente semi-alfabetizada, com pouca qualificação profissional. No entanto, seus filhos não têm a menor idéia do que é ter de comer lagartixa. A realidade mudou no espaço de uma geração.
A caneta pode até ser cara para quem ganha pouco. Mas não é impossível para um pobre no Brasil comprar uma para o filho. Como disse, já houve um tempo em que era impossível para qualquer pobre do mundo comprar papel e caneta. Hoje, não é mais. E sabes porquê, João?
Abraços!
Acho que um dos melhores textos que vc publicou. Uma caneta de R$ 6,00 pode sim ser cara quando muitos brasileiros só têm o dinheiro da passagem! Dá para comprar quanto de comida com esse dinheiro? Ao menos o suficiente para um dia de uma família com quatro pessoas.
Gostei muito desse seu texto, João. Eu já tive dessas canetas de cinco cores. E o meu mundo colorido também desenhava outros mundos em preto e branco.
Parabéns pela excelente reflexão e metáfora.
Abraço.
Isolda.
Gostei da crônica João. Só achei despropositado o comentário do Mário. Aliás, parafraseando o amado presidente d" Mario, nunca na história deste blog havia visto um comentário que me fizesse lembrar tanto a castração da revolução cultural chinesa!
Muy bien!
O Mario não entende de caneta de 5 cores. Ele tentou fazer propaganda politica tipo NUNCA SE CONSUMIU TANTAS CANETAS DE 5 CORES COMO NO NOSSO GOVERNO.
ÔÔÔ Mario a historia é uma exemplificação ,uma metafora .Se vc esta querendo realidade poderia dizer que não existe mais caneta de 5 cores a garotada usa computador.
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